Marrocos por Jorge Barbosa

Quando eu era criança nas terras vermelhas do Marrocos, minha vó com seus cabelos curtos e brancos sempre dizia-me: “O inferno é um lugar perdido no meio do Paraíso, por isso meu filho, quando estiver lá cuidado onde pisa, olhe bem nas grutas, sombras de arbustos e buracos na terra paradisíaca. Lilith se perdeu assim e Eva também”.

Isso que vou lhe contar aconteceu no começo dos tempos, num tempo que Deus se movia a face das águas. Assim quem me contou foi os velhos marroquinos.

Era um dia lindo, ensolarado, Eva passeava pelo Jardim do Éden, quando a serpente chamada Serpente lhe disse: “Colha uma maça e coma”.

Com a cabeça a mulher vacilou um pouco, acabou recusando lembrando o aviso de Deus sobre os frutos da Arvore da Sabedoria. Mas a Serpente era mais esperta e insistiu: “Colha e coma a maça, pois você deve se tornar a mais bela das mulheres desta terra”.

“Mas não há outra mulher aqui”, respondeu tremula Eva.

A Serpente riu se retorcendo e sibilou: “Há e você sabe. Por isso Adão a deixa tanto tempo sozinha diante da Arvore da Sabedoria”.

Eva já com os olhos cheios de lágrimas, sem cor, perguntou: “E onde ela está”?

“Eva, ele não merece sua dor”, falou a Serpente.

Eva limpou o rosto e forçou um sorriso.

“Siga-me”, sibilou a Serpente que subiu uma colina verdejante, alta, parando de frente a um poço de águas claras e calmas.

“É nesta caverna que ele esconde a outra mulher, olhe e confirme sua dúvida”, disse a Serpente.

Eva debruçou-se e viu uma linda mulher, cabelos compridos, brilhantes, não sabia que era seu reflexo, temeu, então voltou chorando a Arvore da Sabedoria, e devorou um dos seus frutos.

O antílope chamado Antílope chegou, e logo vieram Adão e Deus também.

Deus afagou a própria barba e calmamente perguntou: “Quem comeu do fruto da sabedoria”?

Adão respondeu: “Eva”.

“E quem te autorizou Eva?”, perguntou mansamente Deus.

“A Serpente que se chama Serpente e acabou de sair”, respondeu chorando Eva.